Guilherme Valadares: masculinidade saudável para um mundo melhor

O que existe em comum entre um jornalista com o sonho de ser diretor de redação da revista masculina Playboy e o que tem a missão inspirar mudanças positivas e promover a desconstrução de uma sociedade machista e patriarcal? Bom, eles são a mesma pessoa, com um detalhe: 17 anos separam um do outro. Cofundador da plataforma Papo de Homem, Guilherme Valadares é um dos profissionais à frente do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento e Florescimento Humano, uma iniciativa dedicada à transformação e impacto social em diversos territórios.

Guilherme Valadares: masculinidade saudável para um mundo melhor

O começo desta jornada aconteceu em Belo Horizonte, cidade onde Guilherme Nascimento Valadares nasceu há 39 anos. O ano era 2006 e, recém graduado pela UFMG em Jornalismo e Publicidade, ele não se sentia atraído pela perspectiva de carreira que as duas áreas ofereciam. Resolveu então ir pelo caminho do empreendedorismo, criando seu próprio projeto, um veículo digital independente focado no público masculino e que afetasse positivamente a vida dos homens.

Guilherme buscava um veículo que fomentasse o pensamento crítico, com artigos redigidos pela própria comunidade consumidora do site. Da experiência com trabalho com comunidades, o jovem jornalista reuniu o primeiro grupo de articulistas voluntários para tornar o empreendimento realidade. Assim nasceu o blog PapodeHomem, que evoluiu para plataforma e foi a semente para o surgimento do Instituto de Pesquisa e Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento e Florescimento Humano, anos mais tarde.

“São 17 anos desde o início do projeto do Papo de Homem, mas foi em 2015 que nos consolidamos como Instituto. Começamos como um simples blog, evoluímos para uma plataforma, uma editora, uma agência, uma loja - e depois fechamos tudo. Houve altos e baixos, momentos em que quase desistimos. Foi nesse turbilhão que o Instituto emergiu, percebemos o conhecimento valioso que havíamos adquirido ao interagir com homens, mulheres e muitas outras pessoas ao longo de uma década. Esse conhecimento se tornou nossa marca registrada, e passamos a compartilhá-lo com a ONU e outras organizações interessadas”, conta.

O Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento e Florescimento Humano é uma iniciativa dedicada à transformação e impacto social em diversos territórios. Sua atuação se concentra na promoção das masculinidades saudáveis e na promoção da diversidade, equidade e inclusão, considerando todas as dimensões interseccionais. Além disso, existe um forte empenho em promover o diálogo entre indivíduos com visões divergentes, com foco especial na saúde mental dos jornalistas.

O trabalho da entidade já está repercutindo fora do Brasil. Recentemente, Guilherme teve o privilégio de fazer parte de uma conferência das Nações Unidas, em que apresentou o projeto do documentário "Meninos, Sonhando os Homens do Futuro", sobre como a construção das masculinidades tem impactado meninos de várias classes sociais. Ele explica que o documentário será baseado em dados coletados em milhares de entrevistas com o intuito de disseminar a mensagem em escolas, clubes esportivos e instituições. Segundo o jornalista, a abordagem - chamada de "narrativas compassivas", é o resultado de um profundo estudo sobre impacto emocional e práticas de comunicação positivas, sempre embasadas em evidências concretas.

 

Olhando de fora, dirão que foi fácil

Ao relembrar a jornada de quase duas décadas de trabalho, Guilherme cita inúmeros desafios em seu percurso. Após lançar o PapodeHomem, deixou sua Belo Horizonte natal para tentar a sorte em São Paulo. Por ser a maior metrópole do país, enxergava ali oportunidades de negócios e de riquezas de vivências. Em três meses, estava sem dinheiro e sem saber o caminho a tomar.

Ciente que ainda havia muito a aprender, ele buscou a solução ao estilo tradicional: trabalhou o emprego em uma agência de conteúdo digital. Foi um período de contato com mentores e colegas, de troca de ideias que o fizeram evoluir pessoal e profissionalmente, a ponto de, quatro anos mais tarde, sentir-se pronto para largar a estabilidade e se dedicar de corpo e alma ao PapodeHomem e seus pilares fundamentais: conteúdo, comunidades e desenvolvimento humano, fundamentos que segue até hoje.

Como qualquer empreendedor, Guilherme e os sócios também enfrentaram percalços no caminho. Para seguir adiante, ele reflete, é necessária muita persistência, pois em determinado momento, é preciso enfrentar crises profundas. “Quando algo não funciona, a estrutura começa a falhar, persistimos, enfrentamos desafios, acumulamos erros. E antes que se perceba, estamos em um buraco de problemas, más escolhas, e quando tentamos fazer ajustes, é caro. A reestruturação de um negócio é um processo custoso. Por isso, foi preciso muita persistência, resiliência, fé e determinação”, salienta.

O segredo para ter chegado até aqui, segundo Guilherme, foi o foco na pergunta: quais problemas podemos contribuir para solucionar e no que temos de melhor a oferecer. “Por diversas vezes, estivemos à beira do fracasso. A jornada foi desafiadora, mas nossa abordagem compassiva, propositiva e focada em soluções nos permitiu crescer e evoluir. Desenvolvemos workshops, palestras e capacitações que são requisitados por empresas de diversos setores, especialmente em times de diversidade, sustentabilidade e recursos humanos. Hoje, não precisamos mais buscar oportunidades - elas nos encontram, tamanha é a demanda por nosso trabalho”, lembra com carinho.

Para ele, essa trajetória não teria sido possível sem o apoio do Instituto Ling, que proporcionou experiências intensas e transformadoras por meio da bolsa de estudos conquistada através do programa Jornalista de Visão.  “Nosso compromisso com o diálogo, com a compaixão e com a busca por soluções nos permitiu alcançar públicos diversos e promover conversas que muitos considerariam impossíveis. É gratificante ver como nossa missão tem impactado positivamente a sociedade e como estamos constantemente evoluindo para atender às demandas do mundo em constante transformação. Estamos fazendo a diferença. E é graças ao apoio de parceiros como o Instituto Ling que podemos continuar a crescer e a inspirar mudanças significativas no campo do jornalismo e além”, salienta.

 

Escuta ativa para a desconstrução de paradigmas

Guilherme lembra que, no início, o projeto Papo de Homem tinha características machistas, abordando principalmente temas considerados do universo masculino, como futebol, cerveja e sexo. Mas ao longo do tempo, houve a capacidade de se desvencilhar desses padrões e de aprender. Para ele, a transformação do PdH ao longo do tempo foi uma jornada difícil e desafiadora, marcada por estágios como negação, culpa, vergonha, reconhecimento e reparação. Foi essencial contar com amigos e amigas generosos que o ajudaram a crescer e a evoluir.

“Assumimos um compromisso com a diversidade e a saúde mental, reconhecendo a importância dessas questões. Projetos como o “Meninos do Futuro” buscam impactar positivamente a sociedade, por meio de iniciativas que desenvolvem narrativas compassivas e fomentam o jornalismo. Estamos em constante busca por financiamento para expandir nossas ações e impactar escolas, instituições esportivas e comunidades de forma positiva. Esse é o nosso foco e nossa missão principal”, comenta.

Atualmente, o jornalista enxerga sua maior força como também sua maior fragilidade, pois não acredita em um grupo de homens predefinidos. “Pessoalmente, admito que eu mesmo já fui parte do problema, cometendo muitos erros. No entanto, essa experiência me permite ter conversas diretas e honestas com homens em todas as esferas, desde o chão de fábrica até cargos mais altos. É um processo constante de engajamento com a mudança, algo desafiador ao lidar com a transformação humana que buscamos promover”, comemora.

E como o jornalismo ajuda nos desafios atuais? Guilherme responde:

“Observo as pessoas, observo o mundo. Já me perguntaram qual é a essência do que faço e passei meses refletindo sobre isso. Atualmente, acredito que ouvir é o meu foco. Estou sempre atento, sempre escutando. Em diferentes cenários, em várias situações, em conferências. Permaneço sempre ouvindo. E acredito que isso está intrinsecamente ligado ao jornalismo. Um ouvir atento, minucioso. Pois tudo o que fizemos e propomos até hoje surgiu e continua surgindo desse ato de escutar. O documentário "Meninos: Sonhos dos Homens do Futuro", está relacionado ao que foi ouvido na pesquisa com 40 mil pessoas. Assim, é como se fosse uma jornada de escuta e contribuição constante. Vou ouvindo e descobrindo como podemos ajudar. O que podemos fazer? O que é genuíno e eficaz que podemos oferecer? Esta é a bússola principal de atuação do Instituto.”, conclui.

2.4.2024

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