Uma viajante no universo do jornalismo: o olhar global de Cibele Reschke
Correspondente internacional na Dinamarca, Cibele Reschke deu os primeiros passos no mundo do jornalismo há mais de 15 anos. A gaúcha se encontrou tanto na profissão que, ao ler o currículo da repórter, ninguém desconfia que ela um dia cogitou seguir outra carreira. Os intercâmbios e experiências em redações culminaram em dois mestrados: um na Universidade de Pequim e outro na Universidade de Oxford, onde se graduou com distinção acadêmica com bolsa do Programa Jornalista de Visão. Agora, ela une jornalismo e relações internacionais com foco no meio ambiente.

Talvez você já tenha se deparado com ela na tela de sua televisão, relatando os acontecimentos mais recentes da política internacional. Hoje correspondente independente na Dinamarca, reportando para veículos como a GloboNews, Cibele Reschke já esteve em mais de 40 países – a trabalho ou a lazer – e carrega uma bagagem de conhecimentos que unem relações internacionais, políticas de meio ambiente e jornalismo.
Desde cedo, as experiências fora de casa moldaram a trajetória de Cibele. Natural de Porto Alegre, a gaúcha se mudou para o interior do Paraná com a família durante a infância. Aos 14 anos, partiram para o Rio de Janeiro, onde ela cursou o ensino médio. “Minha mãe fez um esforço para nos dar uma educação melhor”, lembra.
“O lado bom é que cresci adaptada às mudanças, quaisquer que elas sejam”. Mais que adaptada, tomou gosto pelo novo e embarcou em diversos intercâmbios e dois mestrados no exterior.
O primeiro mestrado a ensinou a olhar com atenção para as políticas da China e despertou seu interesse pela academia. O segundo, na Universidade de Oxford, concluído em 2024, aprofundou os conhecimentos da jornalista em governança ambiental. Agora, ela desembarcou na Dinamarca para seguir a carreira como correspondente e adentrar uma nova fase, incumbida de um novo papel – ser mãe.
Um encontro nas páginas dos jornais
É comum ouvir histórias de quem já carrega planos de um futuro profissional desde a infância. Para Cibele, não foi esse o caso.
Em 2007, ingressou no curso de Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Sabia que gostava da área de humanas, então segui por um caminho tradicional”, explica. O pano de fundo para o interesse no setor jurídico era o desejo de ser diplomata. Mas depois de um ano na graduação, percebeu que essa não era a trajetória profissional que almejava.
A decisão de trocar de curso veio de um resgate da infância e adolescência. “Sempre gostei de escrever, era minha brincadeira preferida escrever sobre o que tinha acontecido no meu dia, nem sei porque nunca tinha pensado em jornalismo”, conta. “Lembrei que, quando criança, eu brincava de talk show, gravava um programa entrevistando todo mundo com a câmera do meu pai, inventava personagens”.
No jornalismo, encontrou espaço para dar vazão às habilidades na escrita e lugar para explorar seus interesses na política internacional. “É um clichê, mas quando me formei jornalista, percebi que era exatamente aquilo que nasci para fazer”, relata.
Carregando a experiência na bagagem de mão
A conexão com as relações internacionais não foi deixada de lado quando Cibele trocou o Direito pelo Jornalismo. Seu interesse em política global se reflete no caminho de estágios e intercâmbios aos quais se dedicou já durante a graduação.
Seu primeiro emprego foi no setor de comunicação internacional da Vale. “A Vale patrocinava o pavilhão brasileiro na Expo Shangai, e meu interesse na área me levou a buscar um emprego no pavilhão da agência da ONU ‘DEVNET’ lá na Expo. Foi uma experiência bem especial, que abriu muito meus horizontes”, relembra.
O interesse no país asiático rendeu um livro, escrito em parceria com uma professora da UFRJ, e a encaminhou para um mestrado.
De volta à faculdade, em 2011 partiu para Paris para uma graduação sanduíche na Universidade Sorbonne Nouvelle. A cobertura das Olimpíadas de 2012, a partir de uma seleção do Centro de Formação de Jornalistas da França, resultou ainda na oportunidade de passar um mês em Londres fazendo reportagens.
Uma dupla de mestrados
Com o diploma de jornalista em mãos, atuou como editora na TV Globo, escreveu para revistas como Veja, Você S/A e Exame, se tornou freelancer.
Em 2015, voltou ao mundo do acadêmico. Embarcou para a China com uma bolsa de estudos de mestrado na Universidade de Pequim. Durante dois anos, estudou política e relações internacionais. “Sempre tive interesse em estudar na China e queria morar lá de novo. Já me dedicava ao mandarim e entendia que, dentro da mídia, não havia tanta cobertura quanto tem hoje”.
Com essa etapa concluída, passou mais um ano em solo chinês, trabalhando como repórter.
Em 2018, de volta ao Brasil, além de trabalhar como editora da área internacional na GloboNews, Cibele atuava como assessora de relações internacionais na Fiocruz, com foco na Agenda de 2030 para o desenvolvimento sustentável. “Foram dois projetos muito especiais na minha carreira. Estava tão ocupada que sequer estava pensando em estudar de novo naquele momento, mas quando fui indicada para o processo de bolsa do Ling, pensei que era hora de pensar nisso”.
Aprovada no processo seletivo do Programa Jornalista de Visão em 2021, Cibele já tinha clareza sobre a área em que gostaria de se especializar. “A percepção veio de um lugar de entender, a partir da experiência do meu primeiro mestrado, que havia algumas habilidades que eu gostaria de desenvolver. Não só habilidades técnicas acadêmicas, mas também relacionadas à área ambiental”, conta.
Então, em 2023, com mais vivências profissionais na mala, partiu para Oxford. “Iniciativas como a do Instituto Ling são transformadoras – para a maioria dos jornalistas, não seria possível ter a experiência sem esse apoio”.
Sobre a experiência em Oxford, comenta: “Aprendi a pensar o mundo de uma forma diferente. Foi um curso em que aprendi ferramentas acadêmicas, como fazer pesquisa, mas que também me mostrou os aspectos socioculturais e impactos que as mudanças climáticas têm em diferentes camadas da população.”
A dissertação de Cibele em Oxford foi uma junção que representa bem o caminho que ela vem trilhando no jornalismo: o trabalho analisou o impacto do Ministério dos Povos Indígenas no Brasil sobre a diplomacia ambiental indígena. O texto resultou em um capítulo de livro, a ser publicado pela Manchester University Press.
De olho no futuro
Atualmente morando na Dinamarca, onde atua como correspondente independente, Cibele pretende seguir equilibrando vários papéis e interesses, seja na vida profissional ou pessoal. “Meu objetivo é fazer uma cobertura mais especializada em meio ambiente. Pretendo fazer isso depois que terminar minha licença maternidade, porque engravidei assim que terminei o mestrado”, celebra.
Com as habilidades adquiridas na formação acadêmica e nos anos na imprensa na bagagem, ela se vê também ocupando novos espaços em um futuro próximo – como analista ou assessora de políticas públicas, correspondente e, claro, mãe.
“O jornalismo nunca sai da gente, mas me vejo conciliando ele com outras coisas. O envolvimento com políticas públicas e ambientais é algo que considero fazer. Outra porta que Oxford abriu para mim foi da pesquisa acadêmica, o que dá para conciliar perfeitamente com o trabalho de correspondente”, conta.
“Sempre fui muito aberta às oportunidades que apareceram na vida e pretendo continuar assim. Estou animada para essa nova fase”.
E para os colegas jornalistas, deixa uma dica: “Ter esse olhar holístico é o que mais agrega na cobertura. Quanto mais nos especializamos, mais todo mundo sai ganhando – nós e a sociedade como um todo”.
4.7.2025