Olívia Carneiro: a economista tiktoker

A economista Olívia Miranda Carneiro, mais conhecida como Olívia Sensata, pensava aplicar os conteúdos aprendidos no Mestrado de Políticas Públicas na Universidade de Chicago para trabalhar em projetos voltados a problemas sociais. Questões familiares e a pandemia a fizeram rever seus planos. Entre várias possibilidades, Olívia decidiu utilizar seu conhecimento para informar as pessoas sobre economia, compartilhando análises econômicas em vídeos leves. Com esta abordagem fora do estereótipo “homem velho e aborrecido”, conquistou mais de 500 mil seguidores em suas redes sociais.

Olívia Carneiro: a economista tiktoker

Olívia Carneiro narra sua trajetória desde a faculdade de economia até se tornar uma renomada economista criadora de conteúdo nas redes sociais, destacando que as oportunidades surgiram de forma inesperada.  Mesmo escolhendo uma área tradicionalmente dominada por homens, ela conseguiu construir uma carreira sólida, com formação na renomada USP e na Universidade de Chicago. Apesar de enfrentar preconceitos, Olívia ressalta que o mais preocupante é aquele velado, que dificulta o avanço profissional de mulheres sem deixar claras as barreiras.

“Eu me graduei em Economia na USP, apesar de não ter sido uma estudante exemplar. Levei oito anos para concluir meu curso, mas ao finalizar, já estava mais madura e empregada. Trabalhava com análise econômica para políticas públicas, inclusive atuando no caso da regulação do Google no Brasil. Mesmo com um histórico acadêmico desafiador, meu desempenho profissional era reconhecido”, conta.

Ela sentia-se menos preparada do que os renomados economistas com quem trabalhava, e decidiu buscar capacitação técnica fazendo um mestrado. “Inicialmente, tentei em Barcelona, mas encontrei uma série de contratempos que me fizeram repensar meus planos. Com a sugestão de professores, considerei então aplicar para programas nos Estados Unidos, embora duvidasse de minhas chances devido ao meu passado acadêmico”, lembra.

Quando decidiu aplicar para o mestrado, já estava um pouco atrasada, pois todas as rodadas de seleção já tinham passado. Com poucas opções de universidades disponíveis, a escolha foi facilitada, o que acabou sendo positivo para ela. Optou por fazer o seu mestrado em Políticas Públicas, ao invés de Administração, e conseguiu uma bolsa da Universidade de Chicago, além da bolsa do Instituto Ling. Esse apoio financeiro proporcionou uma experiência única, com orientação de vencedores do Nobel e um currículo diferenciado focado em formação de liderança. “Fui muito feliz durante o programa e acabei me surpreendendo ao descobrir um novo universo de estudos, principalmente relacionado à democracia e economia política”.

Ao concluir o mestrado, ela se viu um pouco perdida, explorando possíveis caminhos de carreira. Apesar da incerteza, conseguiu uma oferta de emprego que lhe permitiria permanecer nos Estados Unidos, onde planejava seguir sua trajetória profissional.

 

O caminho se faz ao caminhar

Sua vida deu uma reviravolta quando a mãe sofreu um AVC. Decidiu voltar para o Brasil para ficar ao lado dela e da minha família. “Minha mãe ficou em coma por meses e infelizmente veio a falecer durante a pandemia de Covid-19. Fiquei presa no Brasil, inicialmente por causa dela e depois devido à situação mundial”.

Todos os seus planos foram interrompidos e ela se viu sem rumo. Como boa parte das pessoas durante a pandemia. Constatou que na saúde e em outros setores, proliferavam notícias falsas ou desencontradas, que confundiam as pessoas. Decidiu então usar sua experiência e conhecimento para ajudar as pessoas a navegar por tantas informações.

“Com minha formação e especialização em resolução de crises e conflitos, comecei a produzir conteúdo com o objetivo de oferecer orientação e suporte em tempos turbulentos. Afinal, enfrentamos não só uma crise de saúde global, mas também crises políticas, sociais e econômicas que abalaram a estrutura do mundo como conhecíamos”.

Então, com um repertório sólido em mãos, passou a produzir vídeos onde analisava os impactos econômicos e políticos, passo a passo. Com o tempo, percebeu que seu conteúdo estava agradando um público qualificado e específico, o que resultou em uma boa receptividade e engajamento. Logo, começou a ganhar dinheiro com as redes sociais e a chamar a atenção de grandes empresas.

“Fui até mesmo convidada para trabalhar no governo e para outros cargos. No entanto, enfrentei alguns contratempos ao longo do caminho. Decidi então focar na minha carreira de influenciadora, recusando propostas do mundo corporativo”, conta.

Em um determinado momento, foi abordada por um banco interessado em apostar no TikTok. Inicialmente insegura por não ter experiência com a plataforma, decidiu dar uma chance e se surpreendeu ao conquistar rapidamente mais de 100 mil seguidores e alcançar um grande sucesso financeiro.

“Logo, o TikTok me contratou para participar de um programa de criadores de educação, o qual faz parceria com o Ministério da Educação e Economia. Ao longo do tempo, percebi que as conversas na rede social eram superficiais e difíceis de serem abordadas em apenas um minuto. Diante disso, muitas pessoas sugeriram que eu começasse um podcast, e foi o que fiz. Apesar de inicialmente não ter sido um grande sucesso, persisti e, no ano passado, o podcast decolou e alcançou ótimos índices de audiência, figurando entre os mais escutados no Brasil”, comemora.

Como resultado, Olívia acabou se tornando uma influenciadora e produtora de conteúdo, vivendo dessa atividade e assumindo a persona de uma economista formada no exterior, com experiência e conhecimentos adquiridos ao longo da carreira. O programa de mestrado no exterior foi fundamental para o seu desenvolvimento, e hoje sua carreira só faz sentido graças a ele. “Estou muito feliz com a trajetória que construí até aqui”.

 

A tentativa de explicar às mulheres o que elas já sabem

O termo 'mansplaining' refere-se à prática de homens tentarem explicar algo para mulheres, mesmo que elas já possuam conhecimento sobre o assunto. O mansplaining é como se os homens assumissem que as mulheres precisam de suas explicações, desconsiderando o conhecimento prévio delas. É com essa atitude que Olívia convive diariamente nas redes sociais - uma forma de desmerecer o conhecimento feminino e subestimar suas capacidades.

“Ao longo do tempo, tenho notado algo curioso nos comentários: a grande maioria dos feedbacks negativos são feitos por homens que tentam me ensinar algo. Porém, a realidade é que eles não chegam nem perto do conhecimento que acumulei ao longo dos anos. Parece que ser mulher, economista e jovem traz desafios adicionais, principalmente na área da economia, onde valorizam mais a maturidade masculina clássica. Acredito que minha abordagem mais leve e tranquila tem contribuído para o meu sucesso, já que me afasto do estereótipo do economista velho e aborrecido. Sem dúvida, ser mulher nesta área tem seus desafios, mas também suas vantagens”.

A redução do valor atribuído às opiniões femininas em comparação com as dos homens é ressaltada, indicando uma necessidade de esforço extra por parte das mulheres para se destacarem. Ela conta que tem percebido que a principal dúvida das mulheres está relacionada aos desafios profissionais. “Uma das áreas em que sinto que faço a diferença é na carreira. Muitas pessoas me dizem que mudei suas vidas, pois as ajudei a enxergar novas possibilidades que antes passavam despercebidas”.

Olívia recebe mensagens emocionantes de jovens mulheres que a consideram uma referência inspiradora, pois não encontram muitas mulheres como elas na área. “A falta de representatividade feminina é um problema real, e fico honrada em saber que posso servir como exemplo e incentivo para essas jovens”, salienta.

Além disso, recebe mensagens de pessoas que, mesmo não sendo exatamente sobre carreira, encontram em meu conteúdo alguma forma de esperança e orientação. “Uma vez recebi uma mensagem tocante de um jovem que foi expulso de casa por ser gay e encontrou nas minhas palavras um apoio para seguir em frente e lutar por um futuro melhor. É gratificante saber que meu trabalho pode impactar positivamente a vida de outras pessoas, servindo como referência e inspiração em um mundo que, muitas vezes, parece cruel e desanimador, principalmente para os jovens. A sociedade impõe tantas expectativas e incertezas, mas é importante manter a esperança e a motivação para seguir em frente”.

“Sinto uma grande necessidade de aprender e ser desafiada, buscando a orientação de profissionais mais experientes. Além disso, percebo a importância de me desenvolver como empresária, pois tudo que faço envolve produtos, dinheiro e contratos. Pretendo seguir o caminho de muitos influencers de hoje em dia, buscando novos negócios e mantendo as duas atividades enquanto possível. Além disso, reconheço a importância de oferecer orientações e influenciar de forma positiva a vida financeira de outras mulheres, que possam encontrar em mim um exemplo saudável a ser seguido”.

Olívia não descarta explorar novos horizontes, mas conta que pretende continuar atuando como influenciadora enquanto estiver conseguindo ajudar as pessoas, pois acredita estar  pavimentando um caminho para as próximas gerações de mulheres.

“É importante persistirmos, mesmo diante dos obstáculos, pois cada passo dado hoje facilitará a jornada das que virão depois de nós. É hora de ocupar espaços e fazer acontecer, sabendo que estamos contribuindo para um futuro mais igualitário e diversificado”.

01.03.2024

leia também

Bate-papo com Thiago Kodic: do MBA à indústria do entretenimento

Quando decidiu fazer o MBA em Chicago em 2014, Thiago Kodic não imaginava que 10 anos depois estaria liderando o capítulo brasileiro de uma plataforma global de entretenimento ao vivo. Com o mestrado, migrou do mundo corporativo para o das startups, com passagem pela Uber, e desde o início do ano está na Fever, empresa que tem em seu portfólio eventos como os concertos Candlellight. Tendo como principal missão democratizar o acesso à cultura, Thiago conversou com o blog sobre sua trajetória e os desafios de atuar nessa indústria.

Ler mais

Isabel Pimenta, prática médica aliada à excelência na gestão

A convicção de que o pensar moderno desenvolvido por economistas e administradores ainda não havia sido totalmente absorvido pelo setor de saúde levou a médica Isabel Rocha Pimenta a buscar, em 1999, o MBA da Kellogg, a escola de negócios da Northwestern University, em Chicago, uma das escolas mais conceituadas na área de gestão voltada para este setor. “Os médicos são encarregados e responsáveis por gerir um volume significativo de recursos – o setor de saúde corresponde a 9,7% do PIB no Brasil – e os cursos de medicina não preparavam o profissional para um pensar o sistema”, avalia.

Ler mais

Ivanyra Correia e a presença feminina em cargos estratégicos de liderança

Única mulher a concorrer à vaga no conselho de administração da Petrobras, em abril passado, a engenheira Ivanyra Correia (MBA, 1996) passou por três fases distintas em sua carreira: atuação no mercado financeiro, experiência na indústria e, mais recentemente, participação em conselhos e comitês de empresas como Baumgart, Eletronuclear e Invepar. Para ela, que reconhece que o acesso de mulheres a altos cargos ainda é um desafio, a preparação e a busca pelo conhecimento, incluindo o mestrado em Wharton, foram fundamentais para suas conquistas.  

Ler mais