Foto: Laura Horst Foto: Laura Horst

Tudo o que vi e ouvi na palestra sobre Medicalização e Questões Frequentes, com Thiago Rocha

Um relato da mãe do Arthur, 7 anos, um menino muito amado e muito ativo.

Ao iniciar sua palestra, o Dr. Thiago relembrou sua participação anterior na Escola de Pais, há 5 anos. E então, surge a primeira reflexão da noite. Muita coisa aconteceu nesse período na história mundial, com todos na plateia e, principalmente, com nossas crianças. Logo, refleti sobre a importância dos primeiros cinco anos de uma vida. É nessa janela de tempo que desenvolvemos vínculos emocionais e apego, especialmente com os pais e cuidadores. Por isso, os cinco anos são tão fundamentais para criar uma conexão forte com nossas crianças e construir um ambiente seguro para o crescimento.

O ponto central do nosso encontro recaiu sobre o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). O primeiro mito refutado pelo Dr. Thiago foi que estamos falando de uma doença da modernidade ou da moda. Nada disso. Embora existam fatores ambientais como rotinas aceleradas e os impactos do uso de tecnologia, vimos que sintomas e comportamentos sugestivos de TDAH já foram reportados em publicações dos séculos 18 e 19.

Então, partimos para outra dúvida comum: toda criança agitada, impulsiva e desatenta tem TDAH? A resposta, a princípio, é não. Crianças saudáveis são curiosas e gostam de movimento. São arteiras. Dr. Thiago nos chama a atenção para o fato de que o cérebro de nossos filhos está em amadurecimento e o processo de regulação emocional é uma das últimas estruturas a se desenvolver completamente. Então, penso, é preciso ter muita calma ao rotular uma criança como hiperativa. Para se ter um diagnóstico de TDAH, precisamos observar frequência, intensidade, impacto e duração. Não basta uma crise pontual com duração inferior a 6 meses para definir o diagnóstico. É necessário observar o impacto no desenvolvimento. Há prejuízo na formação escolar? A criança está sofrendo emocionalmente?

 

Foto: Dr. Thiago Rocha durante palestra inaugural do Escola de Pais. Créditos: Laura Horst.

 

Outra dúvida é: qual é a influência genética? Vimos alguns estudos acadêmicos que apontam que há uma prevalência em crianças que possuem irmãos e pais biológicos com sintomas clássicos de TDAH. Lembrei então do meu pai, que costuma fazer referência a um dos netos como “bisneto, neto e filho de hiperativos”, usando o bom humor para falar de hereditariedade.

Entre os dados estatísticos, o Dr. Thiago apresentou estudos que apontam maior frequência de diagnósticos em meninos na faixa etária entre 8 e 14 anos. E sobre as variáveis ambientais, alguns estudos que buscaram mapear fatores de influência apontaram a relevância de algumas como situações estressantes, famílias monoparentais e rotinas desestruturadas. Aqui, acendeu-se a luz amarela novamente para os pais. É nossa responsabilidade consolidar rotinas, mesmo não sendo “famílias de comercial de margarina”. Essas possibilitam que cérebros infantis, imaturos, se preparem e se organizem para diferentes contextos.

Nesse momento, o Dr. Thiago nos apresentou uma questão muito relevante: o TDAH é dimensional, ou seja, as intensidades podem ser muito diferentes. Ou seja, temos crianças com sintomas que têm baixo impacto em seu desenvolvimento e socialização. E temos crianças com sintomas severos que necessitarão de um suporte maior em seu desenvolvimento emocional, com estratégias combinadas de terapia comportamental e medicação.

E chegou o momento da grande pergunta da noite: medicar, sim ou não? O Dr. Thiago esclareceu que essa questão é muito difícil de ser respondida de forma definitiva. Certamente não é a primeira conduta que costuma indicar aos seus pacientes, principalmente quando estamos tratando com crianças pequenas. Quando os sintomas são leves e moderados, a medicação e a psicoterapia têm efeitos muito semelhantes. Na maioria dos casos, a psicoterapia e a orientação parental são as bases do tratamento.

Escutamos também sobre o TOD (Transtorno Opositivo Desafiador), que tem gerado muitas dúvidas, se estamos falando de uma criança apenas questionadora ou se devemos buscar um apoio mais especializado. A ciência ainda não encontrou as causas, embora sua incidência seja bastante frequente; estima-se que 3,6% das crianças em idade escolar possam ter o diagnóstico. Diferente do TDAH, que algumas características neurológicas já foram mapeadas pela ciência, o TOD é definido como uma combinação de sintomas emocionais, sociais e comportamentais.

 

Foto: Dr. Thiago Rocha durante palestra inaugural do Escola de Pais. Créditos: Laura Horst.

 

Antes dos 4 anos, não se costuma realizar o diagnóstico para evitar qualquer confusão com as birras frequentes do terrible two. Para os pais que ainda não passaram pelo terrible two, preparem-se! Tenham muita paciência. Voltando ao TOD, alguns comportamentos são bem característicos: dificuldade para cumprir ordens, discute frequentemente com pais, professores e adultos em geral, tem poucos amigos, é facilmente irritadiço, sem paciência e tem atitudes vingativas. Novamente, para ter o diagnóstico, é necessário que haja um padrão com duração de pelo menos 6 meses, que seja superior ao “mau comportamento” típico da infância, que se manifeste em mais de um ambiente (casa, escola, casa dos avós) e que cause prejuízos significativos na vida escolar e na socialização. Importante destacar que, para o tratamento do TOD, a medicação não é indicada. As condutas com melhores resultados são orientação parental. Portanto, precisamos estudar, buscar apoio e estratégias que promovam entendimento emocional e conexão entre pais e filhos.

Ao chegarmos ao fim do encontro, fomos relembrados de nossa missão ao criar filhos. Não devemos encarar a felicidade como o único propósito da infância, mas sim como uma etapa da vida na qual os pais devem guiar o desenvolvimento de seus filhos por meio da conexão, do apego e da construção dos limites. É difícil, muito! Nossas crianças são o legado que deixamos para a civilização. Como disse o Dr. Thiago: o desafio é árduo, mas a causa é nobre. Mães, Pais, Cuidadores: cuidem-se, busquem ajuda com profissionais sérios, estudem e compartilhem suas angústias. É assim que podemos ter instrumentos para ser pais melhores.

 

Espero vocês no próximo encontro do Escola de Pais, dia 18.10, para refletirmos sobre “Educando para o desconhecido” com Victor Stirnimann.