exposição

DESDE A TONA | Exposição de Dudi Maia Rosa

05/10/2023 às 10h30 até 29/12/2023 às 20h

DESDE A TONA | Exposição de Dudi Maia Rosa

DESDE A TONA – Dudi Maia Rosa

O trabalho de Dudi Maia Rosa tem um marco, descrito em suas declarações e comentado por vários críticos, que é quase uma fábula de origem – e sabe-se que fabulação não se opõe necessariamente a verdade. O relato diz que, a certa altura, houve uma espécie de revelação, quando ele inventou um objeto artístico basicamente feito de resina de poliéster, fibra de vidro e pigmentos, que tende ao tridimensional. Porém umbilicalmente ligado à longa tradição formal e simbólica da pintura, e no qual a distinção entre imagem e suporte se dissolveu.

Com o apelido de “resina”, esses trabalhos têm sido um laboratório da produção de Dudi – embora não exclusivamente –, e seu aspecto geral passou por várias gerações, muitas vezes remetendo ao “quadro”, mas de um modo todo próprio.  Feito pelo artista em um molde deitado, uma das particularidades do objeto “resina” é que o que estava no fundo do molde será a superfície, quando ele estiver pronto para ser levantado na vertical e se apresentar a nós. É como se o que vemos nessas obras se originasse do movimento de fazer algo submerso vir à tona.

Quase todas as “resinas” desta exposição são trabalhos recentes ou nunca mostrados, mas relacionados a uma linhagem há tempos consolidada na produção de Dudi, que soma a expansão generosa da cor ao afloramento, afetivamente irônico, de referências vindas da história da arte. Por exemplo, a pincelada, o grafismo, a listra, o jogo positivo-negativo, a iconografia simbólica (como a cobra-ourobouros), a apropriação de imagens (lá estão duas musas do cinema, Monica Vitti e Odete Lara), e até o quadro ele mesmo e sua moldura – embebida em humor, a materialidade do objeto de arte é, e não é, a própria representação. Uma certa rusticidade se destaca nessa nova safra: no aspecto fragmentário de grandes chapas de cor, na aspereza franca de algumas superfícies, ou, ainda, no desnudamento da própria substância que dá corpo a essas obras.

Rusticidade e fragmento estão igualmente no corpo (e na alma contemporânea) dos pequenos trabalhos que parecem, ao mesmo tempo, atrair e gerar formas, entre materiais no limiar do reconhecimento e coisas identificáveis que surgem na sua superfície compacta. E, desse ponto de vista, são próximos também das esculturas em exposição, já que nelas podemos vislumbrar uma ou outra forma reconhecível do mundo na iminência de aparecer integralmente (uma harpa? um gradil? um ornamento arquitetônico?), ou como se recém-saída da pura matéria (um raio? uma nota musical?).

Mais uma família de obras de Dudi, algumas mostradas aqui, faz pensar em fábulas e coisas que vêm à superfície: a série das Cábulas, que ele executa mesclando técnicas industriais e artesanais deslocadas do habitual. Se o que vemos aflorar nas “resinas” pode ser cogitado como um movimento no espaço, nas Cábulas ele transcorreria mais no tempo, através da memória coletiva. Isso porque suas imagens foram processadas a partir do repertório de antigos desenhos animados, guardando traços da visualidade das fábulas de cinema. Com um DNA assim, não é à toa que essas cenas e aparições de objetos isolados flutuando sobre um fundo mais ou menos homogêneo sejam um pouco como as sobras que identificamos de um sonho. O que, por sua vez, sugere analogias desses trabalhos também com as esculturas e os pequenos relevos, onde algumas coisas se deixam ver individualmente em meio ao que não está completamente revelado ou apenas desinteressado de qualquer semelhança.

Em paralelo à efetiva sedução da sua materialidade, onde a luz opera de tantas maneiras, poderíamos, então, imaginar uma corrente que sobe e desce, entre o fundo e a tona de todas as obras expostas aqui. Ou, dito de outra forma: ao olhar para aquilo que nos chama com força nesses trabalhos, consideremos também o seu “calado”, aquela parte do barco que vai da ponta da quilha submersa até a linha visível da água. Levados por Dudi, neste barco estamos.

João Bandeira

curador

 

A mostra fica em cartaz até 29 de dezembro de 2023, com visitas livres de segunda a sábado, das 10h30 às 20h, e a possibilidade de visitas com mediação para grupos, mediante agendamento prévio e sem custo pelo site.

 

Sobre o curador:

JOÃO BANDEIRA foi coordenador de artes visuais do Centro Maria Antonia da Universidade de São Paulo (2005 a 2016) e atualmente coordena o Espaço das Artes da ECA-USP. Escreveu textos para artistas como Waltercio Caldas, Regina Silveira, Jac Leirner e David Batchelor e fez a curadoria de exposições de Evgen Bavcar (Itaú Cultural, 2003); Nuno Ramos e Cildo Meireles (Maria Antonia, 2012); Lina Bo Bardi (Sesc Pompeia, 2014); Geraldo de Barros, Rubens Gerchman e Antonio Dias (Sesc Pinheiros, 2018); Iole de Freitas (Instituto de Arte Contemporânea, 2018, e Instituto Ling, 2021); entre outros.

Esta programação é uma realização do Instituto Ling e Ministério da Cultura / Governo Federal, com patrocínio da Crown Embalagens.


ficha técnica da exposição

  • Artista

    Dudi Maia Rosa

  • Curador

    João Bandeira

  • Expografia

    João Bandeira

  • Identidade Visual

    Adriana Tazima

  • Produção Executiva

    Laura Cogo

  • Programa Educativo

    Gisele Marteganha

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Sobre o Artista

Dudi Maia Rosa
Foto: Rafaella Crepaldi

DUDI MAIA ROSA tem uma trajetória de mais cinco décadas de trabalho artístico, documentado em publicações e textos de importantes críticos de arte, que destacam sua utilização de técnicas e materiais diferenciados. Realizou sua primeira exposição individual no MASP, em São Paulo (1978), e participou da Bienal de São Paulo (1987 e 1994), da Bienal do Mercosul (2005 e 2015) e da Bienal de Johannesburgo (1995), entre outras mostras coletivas relevantes. Possui obras em coleções dos principais museus do Brasil, além do Stedelijk Museum (Amsterdã) e da Collection Pinault (Paris). Lírica e Tudo de Novo (Galeria Millan, 2019 e 2022) estão entre as suas exposições individuais mais recentes.