Investigar campanhas de desinformação de forma global é a meta de Juliana Gragnani
Selecionada para o programa Jornalista de Visão em 2017, Juliana Kalil Gragnani escolheu estudar Jornalismo Computacional na prestigiada Columbia University em Nova York. Havia recém embarcado para Londres para atuar na BBC Brasil, após cinco anos de trabalho – que renderam várias histórias – na Folha de São Paulo. O curso trouxe uma nova perspectiva para sua carreira, aliando os conhecimentos de programação às pesquisas para reportagens. Este aprendizado também é aplicado atualmente na posição de editora assistente na Disinformation Unit da BBC.
– Somos uma equipe de jornalistas dedicados a descobrir, analisar e investigar quem está por trás da disseminação de notícias falsas em diferentes países – explica Juliana, direto de Londres, onde mora há cinco anos.
Esclarecer informações enganosas é uma das metas do grupo de investigação, que tem jornalistas em outros países além do Reino Unido, como Índia e Nigéria. Antes da criação da equipe, Juliana atuava como jornalista multimídia para a BBC Brasil, onde ficou de 2017 a 2021 produzindo conteúdo sobre o país. Foi neste período que recebeu o Prêmio Petrobras de Jornalismo 2018 por uma reportagem sobre como perfis falsos foram usados para manipular a opinião pública nas eleições brasileiras de 2014.
Aprendendo a navegar pelo jornalismo de dados
Os conhecimentos adquiridos no período de estudos na Columbia são referidos como essenciais desde então e até hoje. Novas ferramentas e habilidades foram incorporadas às anteriores, mais especificamente o básico de programação, que permite a aplicação na prática de análise e extração de dados para apurações no jornalismo.
– É como ter aprendido outra língua – compara Juliana, que além do inglês desde criança e do espanhol fluente atualmente também se dedica a estudar francês. – Foi um salto grande que eu consegui dar com as ferramentas e mudar minha carreira. Ter conhecimento de código ajuda muito no dia a dia no meu trabalho. Hoje sei o que pode ser feito e como fazer para encontrar o que preciso nas investigações.
Um exemplo para entender na prática como se pesquisa a desinformação: os dados estão disponíveis em várias plataformas diferentes, como as redes sociais Twitter, Facebook, Tiktok etc. Algumas plataformas são mais abertas à extração de dados, como o Twitter, então este pode ser o ponto de partida. De forma autônoma, Juliana consegue fazer uma pesquisa prévia, uma sondagem, para investigar algum assunto - conferir se um “trending topic”, por exemplo, foi catapultado por bots (robôs). Depois desta apuração inicial, a jornalista trabalha em parceria com um pesquisador/programador para estabelecer parâmetros e fazer a extração completa dos dados.
Outro tema que a jornalista gosta de acompanhar é relacionado a mudanças climáticas, área de cobertura que inclusive a inspira a estudar mais no futuro, possivelmente em algum mestrado.
– Acredito que essa cobertura vai ser ainda mais importante no futuro – detalha.
Experiências diversas no jornalismo impresso brasileiro
Apaixonada por sua escolha profissional, Juliana lembra que desde criança já dizia que seria jornalista no futuro. Além de gostar de ler e escrever, também sentia aquela vocação de “detetive” na infância. Uma descoberta inusitada, aliás, é contada com curiosidade. Na mudança para Londres, entre caixas e pastas, encontrou um trabalho de idiomas feito aos 14 anos para o colégio. A tarefa era escrever um currículo imaginário em inglês. Guess what? A aluna escreveu que era jornalista e trabalhava na BBC de Londres. Um exercício despretensioso que acabou se realizando anos depois!
Antes da Europa surgir no radar profissional, a trajetória de Juliana incluiu cursar Letras em paralelo ao Jornalismo. Houve até um intercâmbio para Granada, no sul da Espanha, para estudar literatura, história da arte. Na volta ao Brasil, aos 20 anos, enquanto estava no terceiro ano de Comunicação Social, foi aprovada para o programa de trainees da Folha de S. Paulo, deixando a faculdade de Letras de lado. Mas o gosto pela área cultural a direcionou justamente para atuar no suplemento Ilustrada.
Os cinco anos atuando em jornal impresso incluíram o tempo como repórter de políticas culturais e pauteira da Ilustrada. Esta posição, aliás, combina responsabilidade e dedicação diária, pois um pauteiro é o primeiro jornalista a chegar na redação, já com todos os jornais lidos. Dali, Juliana seguiu para a editoria de Cotidiano, realizando matérias especiais de Educação, Cidade, Comportamento e mais. Por fim, passou a cobrir pessoas em situação de rua.
– Aprendi demais com aquelas pessoas. Sempre ouvi histórias muito interessantes. Pessoas internadas à força, pessoas que não conseguiam sair para ficar com suas famílias… A “Cracolândia” em São Paulo é vista como um problema por todas as prefeituras que já passaram por lá. Ninguém conseguiu resolver. Nas matérias mostramos as políticas públicas e principalmente a falta delas – relata Juliana sobre este período, no qual foi indicada ao Jornalista de Visão.
Aos 31 anos, viver na capital britânica tem sido uma experiência de muita qualidade de vida, ainda que sinta falta dos amigos e familiares. Atualmente, curte o tempo livre com atividades de lazer, como ir ao cinema do bairro ou fazer escalada indoor. Aliás, a prática esportiva não é novidade: nos quatro meses que morou em Nova York se dedicou a nadar diariamente em uma piscina pública do Harlem. O treino tinha um objetivo, cumprido em julho daquele ano: ela realizou a travessia do estreito de Bósforo, na Turquia, nadando 6,5 quilômetros junto a mais 2 mil pessoas na aventura, no auge do verão por lá. Mais uma história para a jornalista Juliana contar.