Guilherme Cybis Pereira | Esse lugar não é pra mim
Confira a publicação do bolsista Guilherme Cybis Pereira, atualmente cursando o MBA na Stanford University.
Quantas vezes eu já ouvi de amigos, e também quantas vezes eu já falei pra mim mesmo esta frase que pode ser tão destruidora: “Esse lugar não é pra mim”.
Quando eu tinha 17 anos e estava aplicando para o vestibular em Florianópolis, eu não sabia que brasileiro podia fazer graduação no exterior. Eu já tinha ouvido falar de fulana que era uma estrela do tênis ou ciclano que tinha pais americanos, mas isso me parecia muito mais a exceção do que um caminho possível. Pra falar a verdade, naquela época eu não sabia nem que era permitido fazer a graduação inteira fora do país. Hoje eu não só sei que é permitido, como existem diversas maneiras de chegar lá.
Essa não é a história de um jovem com poucas condições que lutou contra todas as adversidades para crescer na vida. Pelo contrário, eu tive uma criação muito privilegiada. Meus pais inclusive fizeram pós-graduação fora do Brasil, e portanto essa era a minha referência. Eu sabia que se eu estudasse, entrasse em um bom curso na UFSC e tivesse um bom desempenho, eu poderia no futuro aplicar para uma pós-graduação ou um estágio no exterior. E foi o que eu fiz: em 2012–2013, eu passei um ano em Bremen, na Alemanha, fazendo um estágio no laboratório de Eng. de Materiais da universidade. Esse foi um ano decisivo na minha vida, porque desde então o meu horizonte do que é possível se expandiu muito. As pessoas que eu conheci, as histórias que eu ouvi e os lugares que eu visitei abriram a minha cabeça de uma forma até assustadora às vezes: “nossa, quantas vidas possíveis existem, e a gente tá aqui pra viver uma só”.
Grande parte das minhas grandes decisões de vida seguiram essa mesma receita: Eu comecei a competir na vela porque meu pai velejava; eu busquei um programa de Trainee em São Paulo depois do meu mestrado porque a minha namorada tinha feito isso; e eu estou cursando MBA nos Estados Unidos hoje porque minha prima fez isso 15 anos atrás. O “porque” nessas histórias não têm necessariamente uma relação causal, mas o significado de “saber que é possível”.
Eu acho interessante observar o impacto que as referências (ou a falta de) tem na nossa vida — pessoas conhecidas que nos mostrem o que é possível e como. E eu falo conhecidas, porque muitas vezes precisamos ter essa sensação de proximidade, de entender de onde a pessoa vem para nos projetarmos e acreditarmos que também podemos chegar lá. Caso contrário, “é só mais uma história bonita de alguém que chegou num lugar que não é pra mim”.
Eu vejo essa “evolução da consciência” das oportunidades da nossa vida em três etapas:
1. Nem sei que existe;
2. Sei que existe, mas eu não conseguiria;
3. Sei que existe e sei que posso.
De um ponto de vista da nossa felicidade individual, existem diversas discussões entre as mentalidades 1 e 3 sobre qual seria a mais reconfortante. O meu ponto é que a mentalidade 2 é possivelmente a mais danosa para a nossa vida, sob todos os aspectos. E com a explosão das redes sociais e a facilidade de conseguir informação de “segunda ordem”, cada vez mais temos acesso ao que existe no mundo, mas sem a parte mais importante da história que é “como tornar isso possivel”.
Então como conseguimos expandir a nossa consciência e ao mesmo tempo criar um ambiente inclusivo e que incentive as pessoas a perseguirem seus sonhos, a acreditar que elas também podem? Eu não sei como resolver esse problema em escala, e tenho total consciência que existem muitas outras questões muito mais tangíveis que limitam o acesso de milhões de brasileiros ao que quer que sejam os seus sonhos. O meu objetivo com esse texto não é propor uma reflexão ampla sobre o tema até porque eu não seria a melhor pessoa para fazer isso.
O meu objetivo agora é muito mais modesto. Eu quero compartilhar essa pequena parte da minha história com a minha rede para ajudar a refletir sobre as crenças limitantes que a gente tem — eu ainda tenho muitas. Acredito que quanto mais falarmos sobre esse assunto abertamente e com naturalidade, mais vamos conseguir diminuir o gap entre o que a gente acha que é capaz e o nosso potencial real. E, sabendo do impacto que pessoas conhecidas que mostraram o caminho tiveram na minha vida, quero me colocar disponível para compartilhar histórias, apoiar, ou simplesmente ser um ombro amigo para qualquer um que se identifica com a minha trajetória e queira falar. Ofereço isso com o risco de parecer presunçoso, mas com a confiança de que quem me conhece sabe que esse não é o caso. E, principalmente, com a esperança de que eu possa influenciar (o mínimo que seja) algumas pessoas a acreditarem que “esse lugar pode ser pra mim também”.
Publicação original: confira aqui
05.12.2022