O papel da logística no Brasil, com Pedro Palma

Um dos maiores exportadores agrícolas do mundo, o Brasil depende de excelência logística para que a produção chegue aos mercados consumidores. Essa é uma das missões do engenheiro Pedro Palma à frente de uma gigante nacional na área, a Rumo, onde ocupa o cargo de CEO desde março deste ano. Quando ainda poucos jovens do Nordeste faziam MBA, em 2001 Pedro trocou a segurança do emprego em sua Recife natal pelo curso na London Business School, para o qual contou com apoio do Instituto Ling. Na conversa com o blog, ele compartilha sua trajetória desde então e fala da importância da logística para a economia brasileira.

O papel da logística no Brasil, com Pedro Palma

Formado em Engenharia Eletrônica pela Universidade Federal de Pernambuco, Pedro trabalhava na Votorantim do Nordeste quando decidiu buscar oportunidades além das fronteiras da região. Neste momento, o MBA no exterior surgiu como a ferramenta para conseguir o sonhado crescimento profissional e pessoal. O ano era 2000 e o processo de preparação para inscrição era ainda mais desafiador do que hoje.

Mais jovem de cinco irmãos, Pedro, hoje com 50 anos, inspirou-se no exemplo dos pais que, mesmo sem acesso ao ensino superior, trabalharam muito para que todos os filhos completassem a faculdade e sempre consideraram a educação como a ferramenta para o crescimento. E foi sua dedicação e determinação que o levaram de Pernambuco aos bancos escolares londrinos.

“Enquanto trabalhava na Votorantim Nordeste, enfrentei o desafio de conciliar meu emprego com os processos seletivos do MBA em São Paulo, que naquela época eram mais complicados. Era preciso especialmente se destacar no GMAT, um critério essencial das universidades desejadas. Sem cursos preparatórios disponíveis em Recife, precisei estudar por conta própria”, conta.

A estratégia funcionou: com uma nota de GMAT superior a 99% dos concorrentes, Pedro foi aprovado em algumas das principais escolas, tendo optado pela London Business School devido à excelência acadêmica e localização. O próximo desafio a enfrentar eram as despesas do mestrado na Inglaterra. Foi pesquisando sobre o MBA no exterior que ele se deparou com a oportunidade das bolsas do Instituto Ling que, somada ao apoio que recebeu também da Fundação Estudar, ajudaram a financiar o curso, iniciado no segundo semestre de 2001.

“Minha esposa, uma grande apoiadora ao longo dessa jornada, também embarcou nessa nova fase de nossas vidas em Londres. Adaptar-se não foi fácil, a escassez de luz solar em comparação à nossa ensolarada cidade natal, Recife, era um dos fatores que nos afetava. Viver como estudante internacional trouxe desafios, incluindo a crise econômica global pós-11 de setembro. Mas juntos superamos essas adversidades, fortalecendo nosso relacionamento ao longo dos 25 anos de casamento. Enfrentar essas dificuldades lado a lado fortificou nossa união e moldou nosso percurso de vida”, lembra com carinho.

Ao final do MBA, em 2003, o casal voltou ao Brasil e se estabeleceu em São Paulo, onde Pedro assumiu como gerente de planejamento estratégico da Votorantim Cimentos. Passando por diversas áreas, chegou a ser o Head da área de logística, cargo que deixou em meados de 2013 para ingressar na Rumo, a maior operadora logística ferroviária independente do Brasil que, segundo o site corporativo da empresa, é responsável por movimentar 24% do volume de grãos exportados pelo país. 

Hoje residindo em São Paulo e pai de Cecília (20) e Henrique (16), Pedro lida diariamente com os desafios de infraestrutura e transporte em um país de dimensões continentais.

 

Principais desafios logísticos enfrentados no Brasil atualmente

Na opinião de Pedro, devido à sua imensa extensão territorial e diversas demandas logísticas, o Brasil apresenta necessidades específicas em diferentes setores. No entanto, ao se referir ao setor, destaca as commodities agrícolas, devido ao seu grande volume e localização muito distante dos portos no litoral, por onde a produção é exportada. Portanto, segundo ele, há uma urgente necessidade de ampliação da capacidade logística para acompanhar o crescimento da produção agrícola nacional, que é altamente eficiente.

“O Brasil é um grande fornecedor mundial de alimentos e continuará sendo, com destaque para o mercado asiático. É fundamental investir e acelerar o desenvolvimento da infraestrutura logística para atender essa demanda crescente. A empresa que represento tem desempenhado um papel importante nesse processo, expandindo a capacidade ferroviária e contribuindo para o aumento da eficiência no transporte de cargas. Em nove anos, conseguimos dobrar o volume de toneladas transportadas pela ferrovia, além de construir novos trechos que viabilizam o transporte de milhões de toneladas adicionais. Assim será possível atender às demandas do mercado de forma eficiente e sustentável”, salienta.

Pedro conta que, atualmente, sua empresa está trabalhando na construção de mais 700 quilômetros de ferrovia no Mato Grosso, o que certamente resultará em milhões de toneladas adicionais sendo transportadas pelo sistema ferroviário. No entanto, ao observar a magnitude da produção agrícola do Brasil e o volume de exportações, fica claro que ainda há muito a ser feito. 

 “O sistema logístico, principalmente as operações portuárias, são um gargalo e também precisam de atenção. Por isso, decidimos investir em um novo terminal portuário em Santos, com capacidade para movimentar 9 milhões de toneladas de grãos e 3,5 milhões de toneladas de fertilizantes, visando garantir o atendimento à demanda destes produtos. Para ilustrar a necessidade da continuidade de investimentos, Santos precisa de um novo terminal de grãos a cada quatro ou cinco anos para acompanhar o crescimento esperado das exportações. Como país, precisamos continuar investindo para impulsionar esse processo”, enfatiza. 

Para Pedro, esta jornada de investimentos demanda segurança jurídica e acesso à capital a custo adequado, que só ocorrem com estabilidade econômica e regulatória, garantindo assim um ambiente seguro para investimentos em infraestrutura a longo prazo, sem surpresas desagradáveis pelo caminho. “Superar a incerteza do passado no Brasil é um desafio crucial. Manter a previsibilidade e estabilidade, mesmo que ajustes sejam necessários ao longo do tempo, é essencial. Em nosso setor, que envolve contratos de longo prazo, ter uma visão de futuro é fundamental.”, ressalta.

 

Diferenças regionais e limitação à ampliação da malha ferroviária

Pedro explica que, embora a utilização da ferrovia seja benéfica para a economia, também é um investimento financeiramente oneroso. Estima-se que a construção de um quilômetro de ferrovia nova possa custar entre 20 e 25 milhões de reais, enquanto um trem completo, com 120 vagões e 3 locomotivas, custa de 130 a 150 milhões de reais. No entanto, por sua capacidade, segurança operacional e sustentabilidade, a logística ferroviária desempenha um papel crucial na competitividade e no desenvolvimento econômico do Brasil, especialmente em setores como a produção agrícola. Apenas como exemplo, cada tonelada transportada por ferrovia emite 7 vezes menos CO2 quando comparado ao transporte rodoviário e cada trem transporta o equivalente a quase 400 caminhões!

Se há regiões do Brasil onde os trens operam em eficiência similar à de outros países exportadores, existem outras ainda não atendidas, seja por terra ou água:

“Nossa eficiência operacional no Mato Grosso é tão alta, se não superior, comparada às melhores ferrovias dos Estados Unidos em termos de segurança e custo. Graças à nossa operação competitiva, os custos logísticos neste estado não são maiores do que os dos produtores americanos. No entanto, é crucial expandir a malha ferroviária para abranger regiões como o oeste da Bahia, que enfrentam desafios logísticos. As regiões do Maranhão, Piauí e Tocantins também carecem de soluções ferroviárias adequadas. Com relação ao transporte fluvial, apesar de possuirmos rios navegáveis no Brasil, não temos um sistema de hidrovias, o que pressupõe sinalização, controle de tráfego, suporte para as embarcações. 

Por vezes, geografia e clima limitam a expansão. Um exemplo é o estado do Rio Grande do Sul, que enfrenta desafios significativos em relação ao seu sistema de transporte.  

“Recentemente, uma tragédia causou danos significativos em diversas áreas do RS, incluindo trechos da linha férrea que foram completamente destruídos. Esse evento destacou a urgência de lidar com os impactos das mudanças climáticas e a necessidade de reconstruir as infraestruturas danificadas, o que demandará discussões de longo prazo com o governo federal”, comenta.

Assim, para ele, a renovação da Malha Sul, especialmente na região gaúcha, é um ponto em destaque nas negociações com Brasília. Contudo, é importante ressaltar que a operação ferroviária é complexa e requer um investimento significativo para superar desafios topográficos e garantir a competitividade em relação ao transporte rodoviário.

Como CEO da Rumo, Pedro participa do MoveInfra, movimento que reúne os seis principais grupos de infraestrutura logística do país, que operam rodovias, ferrovias, aeroportos, hidrovias, terminais portuários e mobilidade urbana. Ainda que seja um setor B2B, ou seja, onde fornecedores e clientes são empresas, ele diz que o grupo tem sentido a necessidade de democratizar o conhecimento junto à sociedade sobre custos envolvidos, investimentos e segurança nas várias formas de transporte.  “Este é o caminho para superar visões ultrapassadas sobre a operação ferroviária no país.” Operação essa que, como vimos, estará ligada diretamente ao crescimento do Brasil nos próximos anos. 

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