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Chega de Saudade: O legado de Tom Jobim na música brasileira

Um dos maiores expoentes da música brasileira e um dos criadores da Bossa Nova, Tom Jobim é praticamente unanimidade entre críticos e público em termos de qualidade e sofisticação musical. Maestro, pianista, cantor, violonista e compositor apaixonado pela Mata Atlântica, levou seu amor pela natureza e a cidade do Rio de Janeiro para suas canções, que ganharam o mundo na voz de grandes intérpretes.

 

 

VIDA E OBRA

Em 1927 nascia na Tijuca — curiosamente pelas mãos do mesmo médico que fez o parto do sambista Noel Rosa — um dos maiores nomes da música brasileira: Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim. Primeiro filho do casal Nilza Brasileiro de Almeida e Jorge de Oliveira Jobim, Tom passou a infância em Ipanema e Copacabana. Perdeu o pai ainda muito cedo, mas teria pela frente a presença e o incentivo constante do padrasto, o matemático Celso Frota Pessoa. Sua mãe fundaria o Colégio Brasileiro de Almeida, onde Tom teria as suas primeiras aulas de piano, estudando com o professor e musicólogo alemão Hans Joachim Koellreuter, além de outros nomes como Lúcia Branco, Tomás Terán, Alceo Bocchino e Leo Peracchi. Apesar do ingresso na Faculdade de Arquitetura - chegou a trabalhar no escritório do arquiteto Lúcio Costa, Tom Jobim já sabia que a sua verdadeira paixão era a música, abandonando o curso para dedicar-se à carreira musical.

Em 1949, se casa com a namorada da adolescência, Thereza Hermanny, com quem permaneceu até 1978 e teve dois filhos, Paulo e Elizabeth Jobim. No começo da carreira musical, Tom e Thereza moravam em um apartamento minúsculo, onde mal cabia o piano de um quarto de cauda. Ele se apresentava tocando e cantando na noite carioca quando, em 1952, conseguiu um trabalho como músico da orquestra da Rádio Clube. Pouco tempo depois foi transferido para a Gravadora Continental Discos, onde conheceu o maestro Radamés Gnattali e por quem tinha grande admiração. Radamés foi responsável por convidar Jobim a participar do programa Quando os Maestros se Encontram, da Rádio Nacional. Na época, Tom tinha 28 anos e regeu a peça sinfônica A Lenda, composta por ele.

Sua primeira música gravada foi Incerteza, composta por ele e Newton Mendonça em 1953 e interpretada pelo cantor Mauricy Moura. O sucesso chegou no ano seguinte, com a canção Thereza da Praia, fruto da parceria com Billy Blanco, que ganhou os ouvintes nas vozes de Lúcio Alves e Dick Farney. Os caminhos estavam abertos para a música de Jobim e o movimento da Bossa Nova ganharia força com a gravação de Desafinado, na voz de João Gilberto, em 1958. Nesse mesmo ano, Tom lança vários de seus maiores sucessos como Chega de Saudade e o LP Canção do Amor Maior, com a cantora Elizete Cardoso. Suas composições foram gravadas em diversos álbuns nas vozes de grandes nomes da música nacional e internacional, como Elis Regina, Gal Costa, João e Astrud Gilberto, Chico Buarque, Ella Fitzgerald, Louis Armstrong, Frank Sinatra e muitos outros.

A parceria mais celebrada da música brasileira começou em 1956, quando o poeta Vinicius de Moraes convidou Tom para musicar a peça Orfeu da Conceição. Com cenários feitos por Oscar Niemeyer, cartazes desenhados por Djanira e Carlos Scliar, a peça ainda contava com atores do Teatro Experimental do Negro de Abdias Nascimento, que também fez parte do elenco, junto com Ruth de Souza, Haroldo Costa, Ademar Pereira da Silva e outros. Orfeu da Conceição estreou no Teatro Municipal do Rio de Janeiro no dia 25 de setembro daquele ano e foi a primeira vez que atores negros pisaram em seu palco. A peça foi adaptada para o cinema pelo diretor Marcel Camus e ganhou diversos prêmios, incluindo um Oscar!

O ano de 1962 seria marcante na carreira e na vida de Tom Jobim. É neste ano que acontece o histórico show da bossa nova no Carnegie Hall, célebre casa de espetáculos em Nova York. Permaneceu na cidade por um curto período fazendo apresentações com diversos músicos, incluindo o saxofonista Gerry Mulligan, e versando suas músicas para o inglês. Tom voltaria aos EUA dois anos depois para uma longa temporada na cidade de Los Angeles.

Já o ano de 1966 marca uma das parcerias mais notáveis do compositor brasileiro: com ninguém menos que Frank Sinatra! O cantor ligou pessoalmente para Tom, convidando-o a gravar um disco. Além de ficar hospedado na casa de Sinatra, ele pagaria todas as despesas de Jobim. Irrecusável, né? Tom também achou e aceitou inclusive tocar violão, que não era o instrumento que mais dominava. Esse encontro nos presenteou com o LP Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim e um especial de TV em que Tom tocava violão e cantava em dueto com Sinatra. O programa ganhou um Emmy, um dos prêmios mais importantes da televisão estadunidense.

Apesar do sucesso e das muitas premiações, um episódio destoaria do restante de sua carreira e marcaria a música brasileira: em 1968, ao apresentar a canção Sabiá, composta com Chico Buarque, no III Festival Internacional da Canção, enfrentou terríveis vaias da plateia que — sufocada por um triste período de ditadura iniciada em 1964 — preferia a música Pra Não Dizer que Não Falei de Flores, de Geraldo Vandré, com uma mensagem mais direta contra o regime. Mesmo assim, a canção saiu vencedora do festival.

Em 1977 ele se separa de Thereza e um ano depois começa a namorar Ana Beatriz Lontra, com quem permanece até o fim da vida e com quem teve mais dois filhos: João Francisco e Maria Luiza. Em 1987, Tom, a esposa e seus dois filhos mais jovens mudam-se para Nova York, ficando por três anos. De volta ao Brasil, em 1992, é homenageado pela Estação Primeira de Mangueira com o enredo Se Todos Fossem Iguais a Você. Como agradecimento, compôs com Chico Buarque o belíssimo samba Piano na Mangueira. Mas não haveria só flores no caminho do nosso amado compositor: no mesmo ano, ele foi diagnosticado com um câncer na bexiga. Antes de retirar o tumor, Tom ainda se apresentou no Carnegie Hall e em Jerusalém.

Dois anos depois, mesmo se recuperando da doença, seus problemas respiratórios agravaram seu quadro de saúde e ele sofreu duas paradas cardíacas, não resistindo. Faleceu aos 67 anos, deixando esposa, filhos, amigos e toda a nação brasileira órfãos do grande Antônio Brasileiro!

 

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CURIOSIDADES

Você sabia que existe o Instituto Antônio Carlos Jobim? Além de preservar e disponibilizar a obra poética e musical de Tom Jobim, o instituto também é responsável pela catalogação, conservação e disponibilização dos acervos dos artistas Gilberto Gil, Milton Nascimento, Chico Buarque, Dorival Caymmi, Paulo Moura, da atriz Marieta Severo e do arquiteto Lúcio Costa. Para saber mais: acesse http://www.jobim.org/ .

Clarice Lispector entrevistou Tom Jobim em 1968 para a revista Manchete. Essa conversa entre gigantes está disponível para leitura.

Confira a entrevista de Tom Jobim para o programa Roda Viva! Na entrevista gravada em 1993, o músico fala sobre suas parcerias musicais, bossa nova e seu encanto pela fauna brasileira.

 

PRINCIPAIS PREMIAÇÕES

Recebeu o prêmio da The National Academy of Recordings Arts and Sciences, na categoria Best Background Arrangement, pelo disco João Gilberto, em 1962;

No III Festival Internacional da Canção (FIC), realizado no Rio de Janeiro, venceu com a música Sabiá, feita com Chico Buarque, em 1968;

Prêmio da BMI - Broadcast Music Inc. como Great National Popularity, com The Girl From Ipanema (versão de Garota de Ipanema), em 1970, Meditation (versão de Meditação), em 1974, e Desafinado, em 1977;

Prêmio Shell, em 1982, pela contribuição para a música popular brasileira;

Recebeu, em 1985, do Ministério da Cultura Francês, o título de Grand Commandeur da Ordre des Arts et des Lettres;

Em 1988, recebeu o Disco de Ouro e o Prêmio da Crítica de melhor disco do ano para o LP Passarin;

Recebeu, em 1989, o título de Grand Comandeur des Arts et Lettres, da Legion D’Houneur;

Em 1990, recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade do Rio de Janeiro e a Ordem do Rio Branco;

Em 1996, o álbum Antônio Brasileiro recebeu o Grammy The Best Latin Jazz Performance da National Academy of Recording Arts & Sciences.

 

DICAS DO LING

Ficou com gostinho de quero mais? Descobrimos no Prime Vídeo três documentários realizados pelo diretor Roberto de Oliveira, em 2007, sobre a trajetória de Tom Jobim! Confira aqui: Chega de Saudade, Águas de Março e Ela é Carioca.

Para entrar naquele clima de novela do Manoel Carlos escolhemos algumas apresentações icônicas para vocês: o grande Frank Sinatra cantando com Tom Jobim e o show de Tom, Vinicius de Moraes, Miucha e Toquinho na Itália. De quebra, a versão do famoso trompetista e líder de banda de jazz Dizzy Gillespie da canção Chega de Saudade.

Ficou com vontade de ouvir a obra de Jobim? Escute nas plataformas: Youtube Music, Spotify e Deezer.

Conheça as curiosidades por trás das canções de Jobim no livro História de Canções: Tom Jobim, escrito por Wagner Homem e Luiz Roberto Oliveira. Disponível para compra no site da editora LeYa

Já conhece o Spotify do Instituto Ling? Criamos uma playlist especial com todos os homenageados que passaram pelas nossas queridas Audições Comentadas de Jazz. 

 

REFERÊNCIAS

Sem autor: Acervo Antonio Carlos Jobim. Disponível em: https://www.jobim.org/jobim/

Sem autor: Orfeu da Conceição. Site de Vinicius de Moraes. Disponível em: http://viniciusdemoraes.com.br/pt-br/teatro/orfeu-da-conceicao

Sem autor: Pequenos Notáveis. Série televisiva: textos complementares. Parte 2. Prefeitura do Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/media/PDF/pdf_1244.pdf