Bate-papo com Thiago Kodic: do MBA à indústria do entretenimento
Quando decidiu fazer o MBA em Chicago em 2014, Thiago Kodic não imaginava que 10 anos depois estaria liderando o capítulo brasileiro de uma plataforma global de entretenimento ao vivo. Com o mestrado, migrou do mundo corporativo para o das startups, com passagem pela Uber, e desde o início do ano está na Fever, empresa que tem em seu portfólio eventos como os concertos Candlellight. Tendo como principal missão democratizar o acesso à cultura, Thiago conversou com o blog sobre sua trajetória e os desafios de atuar nessa indústria.
O que te fez buscar o MBA?
Quando eu fui fazer o MBA em Chicago, eu estava trabalhando no mercado financeiro, trabalhando com aquisições, aprofundado nesse mundo de finanças, e sentia um pouco de falta do lado mais operacional. De entender, fora da planilha e do PowerPoint, como que operação, marketing, gestão funcionam.
Antes do MBA eu era um pouco tímido, era um pouco reservado. Eu não tinha muita dificuldade de fazer amizades e tal, mas não era algo que me vinha naturalmente. (Com o MBA) me soltei e deu muito certo, transformou meu jeito de comunicar, um pouco da minha personalidade, o que foi muito valioso.
E depois do curso?
Na busca por oportunidade de trabalho, eu explorei algumas coisas, então fiz o meu estágio na Ambev na área comercial e gostei muito. E na época, a BRF, que foi onde eu acabei indo (depois do MBA), estava no momento de transformação de gestão, despontando com uma nova promessa corporativa do Brasil.
Então eu fui para lá fazendo M&A, com essa ideia de aos poucos migrar para operação, para gestão. Mas a experiência corporativa foi frustrante e percebi que não era esse o caminho que eu queria seguir e que eu queria algo muito mais ligado à inovação, tecnologia, ao mundo de startups. Então por um tempo eu tentei colocar de pé uma startup de mobilidade, de patinetes elétricos. Acabou não indo para frente, mas foi uma experiência super legal, que me botou em contato com muita gente boa e no caminho da Uber, que não só era uma empresa com uma cultura muito forte, no nível de gestão de performance, mas que também é referência no mundo de tecnologia e startups. Foi numa área que estava também despontando como uma startup dentro da Uber, que era área de veículos.
Foi ali que eu pude aprender com muitas pessoas de outras áreas e crescer essa área de veículos. Então a gente criou as parcerias que a gente tinha aqui no Brasil, com a Localiza, com a Unidas, Movida, era a maior parceria que a Uber tinha globalmente com qualquer empresa. E daí a gente expandiu o nosso escopo internacionalmente, olhando para o México também.
Trabalhei muito com times de produto, de tecnologia, de engenharia e de marketing. Foi uma experiência super completa. E daí agora, no começo desse ano (2024), surgiu essa oportunidade de ir para a Fever, que é onde eu estou faz alguns meses.
Como chegou na indústria do entretenimento?
Nunca achei que eu ia conseguir entrar nesse mundo. Na verdade, eu nem estava tentando, por achar que estava muito fora. Mas foi curioso porque, acho que umas duas semanas antes de eu ser chamado para a primeira entrevista, eu estava num show de rock de uma banda não muito conhecida, num lugar pequeno, e pensando assim: “nossa, em outra vida, eu teria sido um produtor de eventos, assim eu estaria trazendo todas essas bandas que eu gosto, que não vêm para o Brasil”. Logo depois surgiu essa oportunidade na Fever. Não é exatamente a mesma coisa de trazer shows de banda, mas é muito similar em ter de fazer elenco, de ter uma conexão com o mundo de música, de cultura.
Resumindo, a Fever é um mix do entretenimento ao vivo. Do mesmo jeito que a Netflix começou com o conteúdo de terceiros e daí começou a produzir seus próprios conteúdos, a Fever está nessa fase agora, investindo nos nossos próprios eventos, nas nossas próprias experiências de entretenimento ao vivo.
Quais eventos são esses?
O Candlelight, que são os concertos com luz de velas no palco, hoje é o nosso maior evento. Vendemos, no ano passado, quase 500.000 ingressos só no Brasil, e que é, hoje, a maior porta de entrada do público para a música clássica. É um formato acessível, com só uma hora de show, e você não tem um dress code. Não tem aquela imponência de uma sala de concertos ou teatro, então a ideia é tornar esse acesso à cultura e entretenimento muito mais fácil ao público, com ingressos super baratos também, ticket médio por volta de R$ 100 e com conteúdos e programas bem populares.
Eu sempre fui muito fã de música, de cultura, sempre gostei de ir em eventos e explorar esses conteúdos novos. Então para mim é meio que o emprego dos sonhos, trabalhar na Fever. No nosso site temos eventos de terceiros, que a gente faz a gestão, faz o marketing, faz a etiquetagem, e tem todos os nossos eventos. Eu estou liderando essa frente de eventos próprios no Brasil.
Como empresa internacional, em que locais a Fever está presente? Qual o tamanho a nível mundial?
A Fever é a principal plataforma global de descoberta de entretenimento ao vivo, com a missão de democratizar o acesso à cultura e ao entretenimento presencial. Estamos presentes em todas as regiões do Brasil e em todos os continentes. Desde 2014, inspiramos as pessoas a explorarem suas cidades, visitando exibições imersivas, experiências teatrais interativas, festivais de música, eventos esportivos, e muito mais.
Utilizamos dados e tecnologia para alavancar a criação e distribuição dessas experiências, sejam nossas próprias ou de terceiros, com uma curadoria criteriosa para garantir o máximo de qualidade e relevância da programação.
Estamos lançando agora no Brasil a série We Call It, com a proposta de democratizar e modernizar espetáculos de balé, flamenco, tango, jazz e outros.
Que desafios diferem daqueles de uma empresa mais tradicional?
A indústria do entretenimento tem uma parcela importante de subjetividade: quando um artista vai estourar ou deixar de ser relevante? Será que uma nova série ou filme de uma franquia bem estabelecida vai ser bem recebida? O que realmente vai chamar a atenção do público? Muitas vezes a resposta só vem depois que o investimento já foi feito e o produto está pronto - o resultado de “Joker 2” sendo um exemplo recente disso.
Apesar disso, a escala global da nossa plataforma, em que exatamente o mesmo concerto é apresentado em São Paulo, Paris, e Tóquio, nos permite tomar decisões baseadas em dados, e ter uma assertividade muito maior nas decisões e investimentos. O desafio está em conciliar a parte racional com a parte criativa - olhar para trás para entender o que já deu certo, e olhar para frente para entender para onde o mercado está evoluindo junto com as preferências dos consumidores.
Com o investimento maior pós-pandemia em experiências ao vivo, vimos uma rápida evolução na qualidade dos eventos e nas expectativas do público - as fórmulas que proporcionaram grandes experiências imersivas que faziam sucesso 5 anos atrás já não engajam mais um público muito mais exigente e com muito mais opção de investir seu dinheiro e seu tempo.
O consumidor de experiências quer sentir que a compra do ingresso valeu a pena, ele quer algo único e especial, exclusivo para ele poder compartilhar com sua rede. Qual encontro social hoje não tem uma pessoa recomendando uma série ou filme a outra? Ele quer explorar o novo, com tecnologias de ponta como realidade virtual e inteligência artificial que permitam que ele visite outros mundos. Ele quer estar imerso na experiência, e por um breve instante esquecer dos boletos, das redes sociais, e se perder no momento presente.
Nosso desafio é explorar e expandir essa frente de inovação e criatividade ao mesmo tempo que fazemos profundas conexões emocionais com a audiência.
Tem algum acontecimento nos eventos que gostaria de compartilhar? Algo inusitado que tenha ocorrido?
Um grande exemplo é que toda semana temos pedidos de casamento sendo feitos nos nossos concertos Candlelight. Isso nos motiva a garantir que toda apresentação esteja impecável. Temos o privilégio de criar laços afetivos com nossos conteúdos. É bom para o coração e bom para os negócios.
Que shows/apresentações adorariam trazer para o Brasil?
Temos muitas experiências no mundo que ainda não chegaram ao Brasil, mas estamos trabalhando para trazer eventos desde exposições imersivas, peças de teatro interativas e festivais até pop-ups de degustações moleculares, show de luzes, e mais.
Um conceito que está fazendo enorme sucesso lá fora e que ainda não vimos muito no Brasil, é a fusão do orgânico com o digital, através de projeções de arte digital que ressaltam as qualidades do espaço, seja natural ou arquitetônico, com uma visão artística.
Vida pessoal: pode contar um pouco mais?
Um novo desafio que também demanda muita atenção é o meu outro projeto: ser pai. Criar e formar uma família e fazer isso da melhor forma possível. Quem sabe em breve a gente vai pensar em ter mais um filho? É difícil e dá trabalho, mas a recompensa é 1.000 vezes melhor.
Sinto que virar pai e formar uma família ampliou infinitamente o potencial de alegria, amor e satisfação - que é realizado todo dia. Sou extremamente grato a esse pequeno milagre. Nada se compara a viver um amor tão puro e louco, nada é mais importante.